Quando Coca-Cola e Olimpíadas Têm Que Se Separar
Nem tudo o que brilha é ouro. Essa frase se encaixa perfeitamente quando se trata da longa e controvertida parceria entre a Coca-Cola e os Jogos Olímpicos. Embora essa colaboração pareça uma combinação perfeita, especialistas em saúde pública estão exigindo que ela chegue ao fim.
A Longa Amizade entre a Coca-Cola e as Olimpíadas
A Coca-Cola é a patrocinadora mais antiga dos Jogos Olímpicos, uma relação que remonta a um período em que a própria Coca-Cola ainda continha cocaína em sua fórmula. Nos dias de hoje, a Coca-Cola gasta cerca de $20 milhões por ano para associar sua marca à da olimpíada. Apesar dos possíveis efeitos positivos, o negócio não conseguiu convencer a todos sobre as virtudes da empresa, e as vozes de especialistas em saúde pública pedindo que o Comitê Olímpico Internacional (COI) termine com essa parceria têm se tornado cada vez mais altas nos últimos anos.
O Precedente de Proibir Patrocínios de Tabaco
A proibição do tabaco e o distanciamento cada vez maior dos Jogos de bebidas alcoólicas mostram um consenso aparente de que as Olimpíadas, que colocam os atletas mais aptos do mundo no centro das atenções, não deveriam estar promovendo certos produtos com efeitos negativos na saúde pública. As bebidas açucaradas, que os especialistas ligam diretamente ao diabetes tipo 2, uma condição que afeta cerca de 462 milhões de pessoas em todo o mundo, se encaixam nesse perfil. Os Jogos Olímpicos de 2024, por exemplo, são patrocinados pela Sanofi, uma empresa farmacêutica que pesquisa o diabetes e possíveis tratamentos, e portanto são patrocinados tanto por uma empresa que cria curas para o diabetes tipo 2 quanto por uma que contribui diretamente para a epidemia global.
O Impacto Negativo das Bebidas Açucaradas
Para Robert Lustig, um neuroendocrinologista pediátrico, “Todas as bebidas açucaradas são ruins”. Ele chama a frutose, uma das duas moléculas que compõem o açúcar, de “veneno mitocondrial metabólico” associado à obesidade, diabetes, hipertensão, doenças cardíacas, câncer, demência, doença hepática gordurosa, síndrome dos ovários policísticos e do que se conhece como intestino permeável. “Só que o comportamento da Coca-Cola é um dos mais flagrantes.”
O Benefício da Parceria para a Coca-Cola
Os benefícios da parceria entre a Coca-Cola e as Olimpíadas são mútuos. “Os atletas mais importantes do mundo estão ali em cima segurando garrafas de Coca-Cola”, diz Marian Nestle, professora de nutrição, estudos de alimentos e saúde pública da Universidade de Nova York. “Que tipo de propaganda melhor você poderia ter? Isso desvia a atenção do papel desses alimentos, já que os atletas são realmente saudáveis, caso contrário eles não seriam atletas.”
A Campanha Contra a Parceria
Uma das organizações mais vocais exigindo o fim dessa colaboração é o Center for Science in the Public Interest (CSPI). Ela faz parte da campanha internacional “Kick Big Soda Out of Sport”, que foi lançada em 25 de julho deste ano e conta com o apoio de 66 organizações parceiras. “A associação do COI com a Coca-Cola está minando sua nobre visão de usar o esporte para construir um mundo melhor”, diz o site do CSPI.
A Lição do Tabaco
As empresas de tabaco capitalizaram o impacto cultural das Olimpíadas por quase um século, a partir do nascimento dos jogos modernos em 1896. Em 1984, a Marathon foi o cigarro oficial dos Jogos Olímpicos de Los Angeles. Mas em 1987, após uma campanha liderada pelo médico John Read para banir o fumo e a publicidade de tabaco nos Jogos Olímpicos, as Olimpíadas de Inverno de Calgary se tornaram as primeiras a serem livres de fumaça.
O Exemplo do Álcool
As empresas de bebidas alcoólicas também são outro patrocinador olímpico controverso, desde a Molson Brewery nas Olimpíadas de Montreal em 1976 até a Heineken nos Jogos de Atenas em 2004. Embora o COI seja parceiro da AB InBev, a maior cervejaria do mundo, a Corona Cero – uma bebida zero álcool – é a patrocinadora global de cerveja dos Jogos Olímpicos de Paris. O Comitê Olímpico afirma que isso destaca o “compromisso de ambas as organizações com o consumo responsável e um mundo melhor”.
As Tentativas de Mudança
Os esforços como a campanha “Kick Big Soda Out of Sport” não surgiram do nada. Nos Jogos Olímpicos de Londres 2012, o patrocínio da Coca-Cola, que contava com várias atividades promocionais focadas no engajamento da juventude, enfrentou um forte retrocesso. E em 2021, o patrocínio da empresa mudou; a Coca-Cola agora tem um acordo “Parceiro Olímpico” (TOP) conjunto com a Mengniu, uma empresa chinesa de produtos lácteos, que os torna os patrocinadores exclusivos de bebidas não alcoólicas dos Jogos.
O Futuro da Parceria
Apesar da pressão, os especialistas não esperam que essa parceria termine tão cedo. “Quando houver mais votos do que dólares, aí as coisas vão mudar”, diz Lustig. Eles acreditam que para acabar com o patrocínio de empresas de alimentos ultra processados por organizações esportivas, são necessárias medidas de política pública. Até lá, a Coca-Cola provavelmente manterá sua presença olímpica, mesmo que com algumas mudanças estratégicas.
Conclusão
A longa e polêmica parceria entre a Coca-Cola e os Jogos Olímpicos está longe de chegar ao fim. Embora especialistas em saúde pública exijam o fim dessa colaboração, alegando os efeitos negativos das bebidas açucaradas, a Coca-Cola parece determinada a manter sua presença no maior evento esportivo do mundo. Enquanto isso, os Jogos Olímpicos continuam a lucrar com esse patrocínio, mesmo que isso signifique ir contra o bem-estar de seus atletas e torcedores. Apenas uma mudança radical na opinião pública parece capaz de transformar essa situação.